

Na Serra Pelada, a fome pelo ouro ainda assombra os velhos garimpeiros
"Vai chegar agora um grande filão". Diante de um buraco profundo, o minerador Chico Osório está convencido de que encontrará ouro abundante novamente na Serra Pelada, a mina extinta no Pará que o fotógrafo Sebastião Salgado imortalizou há quase quatro décadas, transformada em um formigueiro humano.
As imagens da cratera de 180 metros de profundidade, que dezenas de milhares de homens cavaram na década de 1980 com o sonho de enriquecer, correram o mundo e tornaram famoso o fotógrafo brasileiro, que morreu em maio, aos 81 anos.
"Nunca vi nada parecido", confessou Salgado em vida sobre aqueles mineradores que subiam e desciam escadas com sacos de terra de 30 quilos nas costas, correndo o risco de cair e morrer a qualquer momento.
Hoje, um lago natural tranquilo, cercado pela natureza, cobre a mina localizada no estado amazônico do Pará, no norte do país, fechado pelo governo em 1992. No entanto, a obsessão pelo metal precioso ainda assombra os garimpeiros.
Aos 77 anos e com o auxílio de muletas, Chico Osório cava ao lado de vários operários no pedaço de terra onde tem sua modesta casa de madeira, às margens do lago.
Sua história é bem conhecida na região: ele era rico, graças aos mais de 1.000 quilos de ouro que encontrou na mina, mas esbanjou tudo.
"Comprei avião, vários carros, comprei tudo de bom", conta à AFP este homem de pele bronzeada, enquanto mostra o que parecem ser partículas de ouro no fundo de uma peneira, brilhando ao sol.
Agora, ele diz, recebe apenas alguns gramas por semana para cobrir as despesas, mas acredita que em breve repetirá o feito.
"Está começando", afirma Osório, ciente de que sua atividade agora está proibida e de que é alvo frequente de operações das autoridades contra garimpos clandestinos na região.
- "Sofrimento alegre" -
A convicção de que ainda há muito ouro a ser extraído é compartilhada por outros ex-garimpeiros que se estabeleceram na Serra Pelada, hoje lar de cerca de 6.000 habitantes, após abandonarem suas vidas em outras regiões do país ainda jovens, atraídos pela febre do ouro.
Apesar das péssimas condições de trabalho que Salgado retratou ao mundo em 1986, a nostalgia prevalece.
"Naquela época era o tempo da vaca gorda, todo mundo era feliz, os que estavam pegando ouro e os que não estavam, porque tinham o sonho" de conquistá-lo, diz Lucindo Ferreira, de 72 anos, orgulhoso proprietário de um volumoso arquivo de revistas e DVDs sobre a mina.
"Era um sofrimento alegre", acrescenta outro dos ex-aventureiros, Francisco Aderbal. "Subíamos e descíamos as escadas e não nos cansávamos", conta hoje este vereador, de 63 anos.
Nem Ferreira nem Aderbal fizeram fortuna na mina, mas eles alertam que muitos que o conseguiram adotaram um estilo de vida agitado, e o dinheiro desapareceu tão rápido quanto chegou.
- O ouro que não dura -
Enquanto borda uma capa de almofada com motivos garimpeiros, Creuza Maria de Conceição relembra a época em que o marido trabalhava na mina e ela cozinhava para muitos colegas, complementando a renda familiar.
"O ouro é uma coisa que a pessoa se apega muito, porque dá dinheiro, mas é um dinheiro que não sei porque na mesma hora acaba", diz a mulher, de 64 anos.
Agora bordadeira, ela garante que a região ainda é um manto do ouro: "Está no chão", basta "cavar um pouquinho".
Alguns ex-garimpeiros pedem o retorno da mineração, após um projeto da empresa canadense Colossus, que foi abortado em 2014 em meio a problemas legais.
"Aquele trabalho manual brutal nunca mais voltará, até porque as leis não permitem mais. Mas a Serra Pelada pode e ainda tem fé que pode voltar a funcionar mecanizado", diz Ferreira.
- Próximo destino turístico -
O Brasil abriga a nona maior reserva de ouro do mundo, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS).
Sob o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), os esforços para reduzir o garimpo ilegal se intensificaram, especialmente em terras indígenas, onde a taxa anual de desmatamento mineiro foi reduzida pela metade em comparação com o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) (2019-2022), segundo o Greenpeace.
As novas gerações da Serra Pelada, por sua vez, estão determinadas a virar a página.
"Apesar de muitos garimpeiros ainda sonharem com a reabertura do garimpo, a gente imagina que talvez não seja a melhor alternativa. Os jovens querem fazer uma faculdade (...), eles não querem mais essa realidade", diz Gabriel Vieira, de 19 anos, que montou uma produtora audiovisual com alguns amigos para mostrar outra face do lugar.
Outro cenário proposto para o local é a aposta da Sebrae no Pará, que anunciou que busca transformar em breve a Serra Pelada em um destino turístico na Amazônia.
"Acreditamos que os pequenos negócios podem ser protagonistas do desenvolvimento sustentável da Amazônia e a transformação de Serra Pelada em um destino turístico com base em suas belezas naturais será a prova disso", disse à AFP o diretor superintendente da Sebrae no Pará, Rubens Magno.
G.Gaillard--JdCdC